Depois de alguns anos, “afastada” da realidade e convivência com a
adicção, passei por uma experiência que, embora tenha me abalado, também
mostrou que estou evoluindo na prática do desligamento.
Aconteceu no âmbito de trabalho.
Tive que lidar com uma situação de delito, ocorrida nas
dependências de um cliente por um funcionário recém-contratado e em experiência.
Nesses vintes dias, até ocorrer o episódio, já tinham acontecido
diversas situações de atraso e escassez de dinheiro.
Comportamentos um tanto quanto “estranhos” para um período de
experiência que, somados a aparência e estado físico demonstravam claramente
que havia algo errado.
Era um candidato promissor! Possuía todas as qualidades esperadas para o
perfil – e essa expectativa velava os indicadores negativos.
Enfim, o episódio veio à tona. As cenas estavam gravadas e com elas as
cortinas se abriram.
Estava lá eu, diante de um adicto, recém contratado e que tinha tudo
para continuar na empresa.
Primeiro passo – liguei para o cliente para esclarecer e amenizar o
episódio.
Em paralelo, todas as ações para localizar o envolvido.
O cliente surpreendeu a todos. Manteve as coisas separadas o que não
afetou em nossas relações comerciais e ainda “deu uma lição de vida” para o
nosso envolvido.
Segundo passo – resolver a relação do envolvido com a empresa.
A primeira parte era complicada por envolver relações com terceiros e
aspectos financeiros. Mas era racional. Bastava usar de inteligência,
comunicação, busca da compreensão (e fui muito felizarda) e assim, tudo se resolveu.
Esta segunda parte dependia de um equilíbrio entre o racional e o
emocional.
E foi um teste para mim.
Desliguei o funcionário, sem abrir mão da entrevista de desligamento.
Fechei uma porta para ele – no meu papel profissional, não podia ser
diferente.
Mas abri outra.
Conversei abertamente sobre a adicção, sobre a história de vida dele
(pessoal e profissional que já conhecia) e fiz um paralelo entre as
duas.
Não o julguei e nem o condenei e nem me compete isso.
Apenas apontei o caminho que ele está, e os caminhos que ele pode
escolher.
Apresentei a programação dos doze passos
E me coloquei a disposição (pessoal), se e quando houvesse interesse e
disponibilidade
Durante essa entrevista o conflito era gritante.
A vontade era de “pegar no colo” mesmo sabendo que esse não era meu papel e
nem minha responsabilidade.
Consegui me superar.
Consegui deixá-lo ir sem me sentir abandonando-o.
Foi a primeira vez que me vi praticando o desligamento com amor, da
forma como tenho lido esses anos todos.
Ficou um “pesar” de culpa – de “podia ter feito algo” (mesmo sabendo que não cabe)
Mas, ao mesmo tempo, ficou o
alívio de que “essa responsabilidade não é minha”.
Nesse dia, fiquei meio
esvaziada, sem energia.
Mas uma boa noite de sono, e
acordei bem!!
E continuo bem, só por hoje!